quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

O Mapeamento Conceitual

Extraído do site
http://www.geocities.com/Colosseum/8026/first.htm

O Mapeamento Conceitual

Amauri Bartoszeck’98

Cada pessoa forma uma imagem mental interna de um cenário. Quando o indivíduo internaliza uma cena esta é expressa nos seus próprios termos, de forma que mais tarde seja capaz de trazê-la a sua mente com maior riqueza de detalhes. Hoje há quase que um consenso que a motivação para aprender e a construção estruturada do conhecimento é uma característica muito pessoal. Na arena educativa o estudante quase nunca chega com uma mente “vazia” mas possui uma estrutura mental, muito sua, particular e pouco transferível. Embora o aprendizado de itens de informação isolados seja importante, por exemplo : lembrar qual o símbolo químico do Potássio; qual o nome do vaso que leva sangue arterial, a maioria das pessoas pode reter na memória entre 4 a 9 itens de informação corrente. Mais do que isto, elas simplesmente esquecem. Para que se tenha o encadeamento das idéias, dos pensamentos de uma forma inteligente, crítica, é necessário que o estudante adicione significado aos itens de informação, inserindo-os no arcabouço conceitual de sua estrutura mental. O estudante precisa filtrar a informação, decidir onde ela se encaixa na constelação dos conceitos. Todos nós precisamos praticar para alçar o item do mero nível de informação esparsa para o nível conceitual mais complexo e abrangente, isto é conhecimento.

O processamento das idéias é feito de maneira distribuída, mas duas estruturas cerebrais, o lobo temporal e o córtex pré-frontal têm importante relacionamento com aspectos da memória, planejamento de comportamento e tomada de decisões. Acredita-se que para ocorrer aprendizagem há uma espécie de “ancoragem” de conhecimento “novo” na estrutura mental de conhecimento prévia, que é um vasto depósito de conhecimentos e experiências. Esta manipulação de idéias e conceitos para que não ocupe todo o pequeno “espaço” da memória é submetida a um regime interno de consolidação, cujos componentes externos são a elaboração de diagramas, fluxogramas e principalmente os Mapas Conceituais.

Não basta entender os fatos, os eventos mas como estes estão organizados, como se relacionam. O mapa conceitual representa relações entre conceitos, como o conceito [x] se relaciona de maneira lógica com o conceito [y]. Esta estratégia educativa enquanto apela para a visualização espacial dos conceitos, respeita o pressuposto básico que as pessoas aprendem de modo, taxa de retenção e recuperação variáveis.

Identidade x diferença

O direito de ser, sendo diferente, na escola. Páginas 191-194.
Maria Teresa Mantoan. In:Rodrigues, D. Inclusão e educação. Doze olhares sobre a educação inclusiva.

Identidade x diferença


As propostas educacionais que visam à inclusão, habitualmente, se apoiam em dimensões éticas conservadoras. Sustentam-se e expressam pela tolerância e pelo respeito ao outro, sentimentos que precisamos analisar com muito cuidado, para entender o que podem esconder em suas entranhas.

A tolerância, como um sentimento aparentemente generoso, pode marcar certa superioridade de quem o expressa. O respeito, como conceito, implica certo essencialismo, uma generalização, que vem da compreensão de que as diferenças são fixas, definitivamente estabelecidas, de tal modo que só nos resta respeitá-las.

Nessas orientações, entendem-se as deficiências como fixadas no indivíduo, como se fossem marcas indeléveis, as quais só nos cabe aceitar, passivamente, pois nada poderá evoluir, além do previsto no quadro geral de suas especificações estáticas: os níveis de comprometimento, as categorias educacionais, os quocientes de inteligência, as predisposições para o trabalho e outras tantas mais.

Consoante a esses pressupostos é que criamos espaços educacionais protegidos, à parte, restritos a determinadas pessoas, ou seja, aquelas que eufemisticamente denominamos com Necessidades Educacionais Especiais.

A diferença, nesses espaços, é o que o outro é - ele é branco, ele é religioso, ele é deficiente -, como afirma Silva (2000), é o que está sempre no outro, que está separado de nós para ser protegido ou para que nos protejamos dele. Em ambos os casos, somos impedidos de realizar a experiência da diferença e de conhecer a riqueza da diversidade. A identidade é o que se é, como afirma o mesmo autor— eu sou brasileiro, sou negro, sou estudante...

Nossa luta pela inclusão escolar tem uma dimensão ética crítica e transformadora. A posição é oposta à anterior, ao entender que as diferenças estão sendo constantemente feitas e refeitas, pois elas vão diferindo, infinitamente. As diferenças são produzidas e não podem ser naturalizadas, como pensamos habitualmente. Essa produção é sustentada por relações de poder e merece ser compreendida, questionada e não apenas respeitada e tolerada.

Os movimentos em favor da inclusão devem seguir outros caminhos que os propostos por nossas políticas (equivocadas?) de inclusão, pois acreditamos nas ações que contestam as fronteiras entre o regular e o especial, o normal e o deficiente, enfim, os espaços simbólicos das diferentes identidades.

As ações educativas inclusivas que propomos têm como eixos o convívio com as diferenças, a aprendizagem como experiência relacional, participativa, que produz sentido para o aluno, pois contempla a sua subjetividade.

É certo que relações de poder presidem a produção das diferenças na escola, mas conforme uma lógica que não mais se baseia na igualdade, como categoria assegurada por princípios liberais, inventada e decretada, a priori, que trata a realidade escolar com a ilusão da homogeneidade, promovendo e justificando a fragmentação do ensino em disciplinas, modalidades de ensino regular, especial, seriações, classificações, hierarquias de conhecimentos.

Por tudo isso, a inclusão é produto de uma educação plural, democrática e transgressora. Ela provoca uma crise escolar, ou melhor, uma crise de identidade institucional, que, por sua vez, abala a identidade dos professores e faz que a identidade do aluno seja ressignificada. O aluno da escola inclusiva é outro sujeito, que não tem uma identidade fixada em modelos ideais, permanentes, essenciais.

O direito à diferença nas escolas desconstrói, portanto, o sistema atual de significação escolar excludente, normativo, elitista, com suas medidas e mecanismos de produção da identidade e da diferença.

Se a igualdade é referência, podemos inventar o que quisermos para agrupar e rotular os alunos como deficientes. Se a diferença é tomada como parâmetro, não fixamos mais a igualdade como norma e fazemos cair toda uma hierarquia das igualdades e diferenças que sustentam a "normalização". Esse processo, a normalização, pelo qual a educação especial tem proclamado seu poder, propõe sutilmente, com base em características devidamente selecionadas como positivas, a eleição arbitrária de uma identidade "normal", como um padrão de hierarquização e avaliação de alunos, de pessoas. Contrariar a perspectiva de uma escola que se pauta pela igualdade de oportunidades é fazer a diferença, reconhecê-la e valorizá-la.

Temos, então, de reconhecer as diferentes culturas, a pluralidade das manifestações intelectuais, sociais, afetivas. Nem todas as diferenças necessariamente inferiorizam as pessoas. Há diferenças e há igualdades, e nem tudo deve ser igual nem tudo deve ser diferente. Então, como conclui Santos (1995), é preciso que tenhamos o direito de ser diferentes quando a igualdade nos descaracteriza e o direito de ser iguais quando a diferença nos inferioriza.

No desejo de assegurar a homogeneidade nos grupos sociais, nas turmas escolares, destruíram-se muitas diferenças que consideramos valiosas e importantes, hoje, nas salas de aula e para além delas. A identidade fixa, estável, acabada, própria do sujeito cartesiano unificado e racional, também está em crise (Hall, 2000). As identidades naturalizadas dão estabilidade ao mundo social, mas a mistura, a hibridização, a mestiçagem desestabilizam as identidades.

Normalização: violenta imposição de uma suposta identidade única, fictícia daquilo que é pensado como normal (Silva, 1997, Skliar, 2003).

Normalizar: escolher arbitrariamente uma identidade e fazer dela a identidade, a única possível e verdadeira.

Ex.: Norma corporal, da língua, da aprendizagem, da sexualidade, da atenção, etc.

Aristóteles: diferença está na determinação do que as coisas diferem; alteridade não carrega essa determinação; simplesmente há outro ser.
Tal como um avestruz, escondendo a cabeça na areia?


AMARAL, L. A. Sobre crocodilos e avestruzes. In: AQUINO, J. G. Diferenças e preconceito na escola. Summus Editorial. Pág. 19-28.

Antes de mais nada desejo esclarecer o que é um mecanismo de defesa. Trata-se de conceito inicialmente formulado por Freud em 1926, e posteriormente desenvolvido por Anna Freud, Otto Fenichel, José Bleger e outros autores.

Para Bleger (1977), mecanismos de defesa são técnicas ou estratégias com que a personalidade total opera para manter o equilíbrio intrapsíquico, eliminando fontes de insegurança, perigo, tensão ou ansiedade, quando, por alguma razão, não está sendo possível lidar com a realidade.

Por outro lado, Goffman (1982), que nos fala de estigma e das relações mistas, nos lembra que estas são, por definição, relações tensas e ansiógenas.

Quero com isso dizer que nas situações em que entrar realisticamente em pleno contato com a diferença significativa (ou mesmo entrar em conflito com o sentimento de rejeição que ela pode gerar) não é uma possibilidade psicológica imediata, e havendo a necessidade de "fugir" da questão, podemos assumir a postura de avestruz: enfiamos a cabeça na areia para não ver o que não queremos ou não podemos ver.

Ou dito de outra forma: se reconhecer a diferença significativa do outro (ou nossa rejeição a ela) nos causa profundo mal-estar, tensão e ansiedade, uma das possibilidades é o acionamento do mecanismo de defesa da negação,7 o qual pode revestir-se de algumas roupagens específicas: compensação, simulação e atenuação.

No cotidiano usamos certas expressões "clássicas" que ilustram essas três formas de negação. Exemplos delas não faltam em nosso repertório do dia-a-dia.

Ao dizermos (ou até mesmo pensarmos) frases do tipo: "é paralítico mas tão inteligente", "é negro mas tem alma de branco", "é homossexual mas tão sensível"... estamos compensando aquela característica ou condição que consideramos espúria e, portanto, negando-a ao contrapô-la a um atributo desejável — o "mas" denuncia isso.

Dizemos também: "podia ser pior", "não tem uma perna—e podia não ter as duas!", "não é tão grave assim"... Nesse caso, será que não estamos negando, pela atenuação, a especificidade (tipo e dimensão, por exemplo) de dada condição ou característica?

A simulação ocorre quando negamos literalmente a diferença: "é cego, mas é como se não fosse", "é homossexual mas nem parece"... Fazemos “de conta que”.

O fato é que enfiar a cabeça na areia não nos liberta da armadilha relacional (continuamos sofrendo a ansiedade na relação interpessoal), nem facilita a vida do significativamente diferente, seja ele diferente nesta ou naquela condição, esteja ele neste ou naquele contexto—inclusive, e talvez até especialmente, no educacional.

Um pouco mais sobre diversidade/deficiência ou "água mole em pedra dura tanto bate até que fura"

Todos nós, de uma ou de outra forma, já sabemos, um pouco pelo menos, a evolução dos conceitos referidos à condição de deficiência pelas práticas sociais a eles aliadas. Ou seja, já sabemos que, decorrentes dos conceitos em vigência em diferentes momentos, ocorreram movimentos de extermínio, marginalização, confinamento, veneração, temores profundos, omissão, pessimismo, paternalismo exacerbado e explícito, paternalismo camuflado, descrédito, segregação, credibilidade, investimento em educação e reabilitação, extermínio novamente, marginalização, pseudo-integração, integração real, luta pela cidadania...

A indagação maior que se coloca pode ser assim formulada: como contribuir para o avanço do conhecimento nessa área tão impregnada de ambivalência e ambiguidade, tão entranhada de preconceitos, estereótipos e estigma, tão "território de ninguém" e, simultaneamente, tão "pertencente" a tantos proprietários/especialistas?

Claro está que a "mesma" contribuição sempre é possível quando outros são os interlocutores. Porém mesmo assim, em outras ocasiões, como hoje, o desejo de introduzir novas vertentes para reflexão trazia (e traz) consigo a sedução e o desafio do pensar.

Brincando com as ideias, diria que a Educação, como cada um de nós, deve escolher a roupa adequada para os dias frios assim como para os de calor, os alimentos compatíveis com o horário e/ou clima, os comportamentos para as situações de alegria ou de tristeza, as expressões emocionais para momentos públicos ou de intimidade... Enfim, escolher o melhor (para cada um de nós e para aqueles que nos cercam) para um melhor viver.

Voltando ao "água mole em pedra dura tanto bate até que fura", devo confessar que foi fascinante a experiência de pensar sobre esse "ditado", pelas razões que compartilho a seguir.

Quando a expressão me ocorreu referia-se, evidentemente, à ideia de que seria válido voltar, tantas vezes quanto possível, a uma mesma reflexão para que, finalmente, um dia, quem sabe, ela pudesse atravessar as muralhas de pedra dos preconceitos a que estamos sujeitos, como seres humanos que somos e, muitas vezes, sem nem nos apercebermos de sua presença em nós mesmos.

Quanto ao referido aluno: incompetência, pobreza, inclusão em família "desestruturada", deficiência, doença... Quanto ao professor: desinteresse (pela desvalorização do papel social e pelo aviltamento salarial), inadequação da formação, falta de "reciclagem", não investimento em aprendizagem de novas "técnicas" e/ou teorias...

Alguns de nós vêm chamando essas colocações de "culpabilização da vítima".

Passemos agora à discussão sobre o que é deficiência, que divide com outros (muitos) conceitos a representação de fenômeno multifacetado, impregnado de denotações e conotações. Dentre esses muitos, pensemos nas outras diferenças significativas, ligadas, por exemplo, a: religiosidade, homossexualidade, velhice...

Lembremos também que o conjunto formado por conceito/definição de deficiência aponta, inexoravelmente, para os contextos em que tem sido engendrado. Desejo portanto frisar que, ao nos debruçarmos sobre um conjunto conceito/definição, é imprescindível lembrar que essa díade é sempre historicamente datada.

Ou seja, em dado contexto elabora-se um conceito (representando um objeto de uma dada forma), o qual é operacionalmente descrito por uma definição que visa à ampla compreensão daquele, bem como sua divulgação e apropriação pelos receptores previstos.

Essas afirmações prendem-se ao fato de desejar, aqui, enfatizar minha leitura: penso que o conceito de deficiência e sua definição passam por dimensões descritivas e por dimensões valorativas, tendo sempre um caráter histórico concreto: um determinado momento, num contexto socioeconômico-cultural específico.

Passo a compartilhar, embora de forma bastante reduzida, algumas das sugestões nele contidas (OMS/SNR, 1989):

DEFICIÊNCIA (impairment) refere-se a uma perda ou anormalidade de estrutura ou função: Deficiências são relativas a toda alteração do corpo ou da aparência física, de um órgão ou de uma função, qualquer que seja a sua causa; em princípio deficiências significam perturbações no nível de órgão, (grifos meus)

INCAPACIDADE (disability) refere-se à restrição de atividades em decorrência de uma deficiência: Incapacidades refletem as consequências das deficiências em termos de desempenho e atividade funcional do indivíduo; as incapacidades representam perturbações ao nível da própria pessoa, (grifos meus)

DESVANTAGEM (handicap) refere-se à condição social de prejuízo resultante de deficiência e/ou incapacidade: Desvantagens dizem respeito aos prejuízos que o indivíduo experimenta devido à sua deficiência e incapacidade', as desvantagens refletem pois a adaptação do indivíduo e a interação dele com seu meio, (grifos meus)

Tenho, há vários anos, pensado a deficiência, corno fenômeno global, distribuída em dois subfenômenos/ deficiência primária (deficiência e incapacidade) e deficiência secundária (desvantagem).

Em minha visão a primeira delas (a deficiência primária) está remetida a aspectos descritivos, intrínsecos (ou qualquer nome que se queira dar) e a segunda, basicamente, a aspectos relativos, valorativos, extrínsecos...

A deficiência primária pode impedir ritmos e formas usuais de desenvolvimento, mas não a sua ocorrência — o que de fato vem a suceder, muitas vezes, em decorrência das variáveis envolvidas na problemática da "desvantagem" (deficiência secundária). Ou seja, estou referindo-me a questões que apontam para a relativização inerente à própria ideia de desvantagem. Só se está em desvantagem em relação a algo ou alguém! E é na possibilidade de problematização da desvantagem, da deficiência secundária, que repousa a maior contribuição da atual conceituação-definição-nomenclatura — "malgrado" oriunda de um modelo médico.

Em relação à "deficiência" e à "incapacidade" (que, como já dito, entendo como "deficiência primária") não desejo alongar-me, até porque sou ardorosa defensora da ideia de que as deficiências existem (e não são apenas socialmente construídas), assim como existem incapacidades delas decorrentes. É uma questão descritiva: é o olho lesado e o não ver, é a medula lesionada e o não andar...

Mas a que nos remete a própria ideia de "desvantagem", de prejuízo? A peculiaridades intrapsíquicas sim, porém, com certeza, a contingências preponderantemente sociais: as chamadas especificidades socioeconômico-culturais, tais como sistema econômico, organização política, crenças e valores, leituras e interpretações sociais e, em consequência, a um conjunto de ações/reações ao fenómeno deficiência e às pessoas que o corporificam.

Talvez aí esteja, afinal, a verdadeira revolução: a mudança radical dessas interações sociais — até agora tão marcadas pelo maniqueísmo da plenitude versus falha, sanidade versus insanidade, perfeição versas imperfeição, eficiência versus ineficiência: DEFICIÊNCIA?

A questão conceitual (e seus desdobramentos em definições e nomenclaturas) não se limita a mero exercício de retórica. Penso, ao contrário, que a problematização desse aspecto traz subsídios fundamentais para uma outra (e talvez subsequente) temática: a da integração social ou comunitária (como nomeiam diferentes autores) desse abstrato coletivo "crianças com deficiência", expresso nas individualidades que o compõem.

Ou, a partir de outro ângulo, penso que essa discussão pode ir realmente muito além de um exercício de retórica. Penso que, mais do que isso, a questão conceitual pode encaminhar novas formas de interação humana, uma vez que se ponham a descoberto os aspectos intimamente vinculados à desvantagem, especialmente em sua vertente social.

E ainda: cada um de nós pode subverter alguns dos postulados vigentes, revolucionar a mentalidade hegemônica. Essa seria, para além da própria revolução conceitual, a revolução micropolítica, detonada e exercida no cotidiano, nas interações do dia-a-dia — e talvez especialmente no cotidiano escolar.